Como chegou até aqui?

domingo, novembro 26, 2006

ainda bem que me faz essa pergunta joão paulo silva

João Paulo Silva é o convidado deste ainda bem que me faz essa pergunta. Actualmente jornalista do Diário de Leiria, nasceu pouco antes da hora de almoço, num distante três de Janeiro, andava a família ainda a comer os restos da passagem de ano. Deu de caras com a malta lá de casa com uma certa azia, não se sabe se devido ao tempero, se por ser oitavo candidato à herança. Depois de o ver, o pai deu por finda a sua tarefa. Ou tinha finalmente conseguido ou resolveu desistir. Fica o mistério. Foi depois à escola, passou ao lado da tropa e de muitas outras coisas, mas cá está, a descrever coisas do mundo em pequenas notícias. Trinta e quatro anos depois. Valha-lhe Deus.

Com ou sem ajuda divina, foi ele que deitou mãos e sabe-se lá mais o quê à obra para encontrar as perguntas airosas que se seguem para as respostas pertinentes que lhe foram lançadas.

João Paulo Silva» A mais brilhante síntese de Portugal caracteriza-nos como o país dos três efes. De Fátima, do Futebol e do Fado. A partir de agora vamos obviamente passar a ser o país dos quatro efes. Acha que isso pode alterar a matriz sociológica do país? Até que ponto este fenómeno pode ter implicações na identidade de um operariado que parece ter finalmente encontrado um modelo capaz de o conduzir a um estado mais evoluído, de uma sociedade, digamos, ri-fixe?
diospirojoyeux» Como pode comparar a Floribella a isso? Onde já se viu? O descaramento e o cinismo arrepiam, ouviu? Até parece que quer esconder com isso um projecto-lei alternativo que permitia superar os problemas de todos os cantoneiros do país a trabalhar nas mesmas condições de penosidade e risco.

João Paulo Silva» Os últimos pregões da CGTP indiciam um retrocesso no uso da métrica. Por exemplo, na Marinha Grande, na última manifestação, as mulheres gritavam “Sócrates aldrabão/faz contas com o patrão” como se declamassem Agustina Bessa-Luís. O estranho é que se diz, à boca cheia, que os pregões são seus.
diospirojoyeux» Como diria a Agustina Bessa-Luís, a perversidade sempre me acompanhou. Claro que se eu fosse Agustina seria mais Luís e menos Bessa, porque ela é deveras Bessa.

João Paulo Silva» Não acha que estão a cometer uma injustiça histórica ao calarem pregões como o “Trabalho sim/desemprego não”, este com evidentes influências pessoanas, um autor muito mais atento aos fenómenos da industrialização e à sua estética?
diospirojoyeux» A vida, como tudo o resto, é assim.

João Paulo Silva» Desculpe insistir, mas Portugal afirmou-se como país de poetas nas manifestações da CGTP.
diospirojoyeux» Olhe que não, doutor, olhe que não.

João Paulo Silva» Há até quem fale de uma nova corrente na literatura portuguesa, que o coloca ao lado de Rosa Lobato Faria.
diospirojoyeux» Não me compare a essa senhora, se faz favor.

João Paulo Silva» As semelhanças entre os dois estilos são evidentes. “Sócrates aldrabão/faz contas com o patrão” poderia perfeitamente ser o refrão de uma canção concorrente ao festival da canção da RTP. Aliás, por que não abrir um novo género de música de intervenção, com a popular cantora Dina?
diospirojoyeux» Porque não. Não gosto, pronto!

João Paulo Silva» Desculpe, mas nos dias que correm é frequente ver líderes de confederações sindicais ao lado de cantores pimba no programa da Fátima Lopes. Aliás, julgo que foi assim que conheceu o padre Luís Borga, outro homem com profundas marcas na cultura popular portuguesa. Não receia que este profanar de uma certa dignidade da classe sindical possa vir a causar-lhe problemas. Por exemplo, que comecem a olhar para a sua careca como o eleitorado italiano olhou em tempos para os seios da Cicciolina. É por esta a razão que foge de Lili Caneças, ou tem medo da sua dialéctica?
diospirojoyeux» Se não a cumprimento, também não lhe digo nada.

João Paulo Silva» Consta que antes de ser calvo usou risco ao meio ou pelo menos fez vários ensaios ao espelho. No entanto, a calvície, que tenta disfarçar com essa camada de cera, dá-lhe um certo ar abastado. A partir de quantos euros se passa de sindicalista a porco fascista, onde está a fronteira? Já alguma vez foi confundido com um porco fascista, ou já se sentiu na pele de um?
diospirojoyeux» Não, também não sou pobre. Vocês têm de ter cuidado com as perguntas. Não me pode perguntar o que é um rico, porque eu não sei. E peço-lhe o favor de não contar os meus euros.

João Paulo Silva» Se tivesse um presépio que pudesse sintetizar a sociedade portuguesa, que imagens colocaria, na cabana, para substituir, por esta ordem, S. José, Nossa Senhora e o menino?
diospirojoyeux» Pedro Paixão, Alexandrino e um porteiro de discoteca anafado, obviamente.

João Paulo Silva» Não se sente enciumado pelo facto de a Felícia Cabrita, com uma simples notícia, ter provocado um abalo maior nos alicerces do sistema do que décadas de lutas sindicais por si lideradas? É verdade que ela foi sondada para editora do Avante?
diospirojoyeux» É preciso esclarecer que, antes de escrever aquela notícia, nunca ninguém mostrou o menor interesse no assunto. Mas isso nunca esteve em cima da mesa. Nem antes, nem depois.

Sem comentários: